Por Angelica Tomassini e Nívea Martins
A ação para o fortalecimento do protagonismo das mulheres, sobretudo nos espaços políticos de gestão social e de defesa de direitos, é um dos pontos norteadores da Plataforma MROSC. Através de rodas de conversa, encontros estaduais e nacionais voltados para as mulheres, a Plataforma vem debatendo e convidando as mulheres do campo e da cidade a se apropriarem dos espaços e discussões na luta por um novo Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil.
Para evidenciar as diversas mulheres, suas histórias de luta e militância, envolvidas hoje na Plataforma e/ou nas organizações signatárias, foi lançado no dia 8 de março de 2022, a campanha Mulheres que Inspiram, uma série de entrevistas para conhecermos essas lideranças que estão na base e que diariamente lutam por seus direitos.
Para muito além de comemorar, é importante lembrarmos todas as mulheres que representam uma fonte inesgotável de força e perseverança, correndo atrás de condições melhores para todas as outras, independente se são mulheres da vida pública ou que fazem história silenciosamente no nosso dia a dia.
Por isso, a nossa ideia hoje não é comemorar a data, mas sim, celebrar as mulheres que, ao fazerem história, influenciam a nossa.
Diferentes Histórias Mas Com Um Objetivo Comum: A Luta Por Direitos
Nossa campanha abriu-se com uma mulher que dedicou sua vida à luta pela defesa dos direitos humanos: Eliana Rolemberg, desde os tempos estudantis lutou pela democracia, mostrando sua bravura e resistência durante os anos mais obscuros do nosso país: a ditadura militar. “Foram momentos duros, mas nunca pensei em desistir, pois cada experiência me ensinou demais! Na prisão eu aprendi o respeito às diferenças, pois eram várias posições políticas, crenças e costumes convivendo, e todas tinham um mesmo inimigo: a repressão”, destaca Eliana, a qual foi presa e torturada pela repressão política em 1970, no estado de São Paulo, sendo liberada dois anos depois. Hoje Eliana representa a Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE) no Comitê Facilitador da Plataforma MROSC e Vice-Presidente do CONFOCO/BA.
Naquela época, outra mulher estava batalhando para uma mudança radical na vida das pessoas trans e travestis: Keila Simpson, mulher negra, prostituta e transexual, foi pioneira no combate ao HIV nos anos ‘90. Atualmente Keila, é Presidente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) representando um dos principais nomes da luta LGBTQIA+ do Brasil, e lutando a cada dia para que sua comunidade seja aceita e respeitada. “Para mim não existe um modelo ideal, mas sim um plano adequado. Gostaria que a sociedade aceitasse minha comunidade, que as escolas fossem mais inclusivas, que a gente não fosse barrada em lugar nenhum e que não tivéssemos que explicar cada dia quem somos e porque somos assim.”, manifestou Keila durante nossa entrevista.
Conversando com essas guerras entendemos que, pelo bem estar da nossa sociedade, é fundamental levantar bandeiras que vão além das nossas crenças religiosas e/ou políticas: a Pastora Romi Bencke é a primeira mulher a assumir a Secretária-Geral do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil – CONIC, e é um exemplo da promoção do diálogo ecumênico, inter-religioso e a defesa dos direitos humanos.
“Faço parte de um coletivo de pastoras e mulheres religiosas que, antes da instituição, colocam o seu ministério a serviço dos direitos humanos. São mulheres católicas e evangélicas, do candomblé e de outras vertentes religiosas” relatou a Pastora. Segundo ela, para que nossa sociedade seja mais tolerante é fundamental afirmar e valorizar uma das dimensões que mais caracterizam o Brasil: a diversidade religiosa em todas suas expressões, por exemplo ao respeito às mulheres, aos terreiros, aos povos indígenas, etc.
Além do diálogo inter-religioso, para ser um país verdadeiramente democrático e igualitário, o Brasil também precisa reconhecer a ancestralidade e o protagonismo quilombola no Brasil. Isto é o objetivo de Sirlene Santos, do coletivo Mulheres Quilombolas em Ação de Morro do Chapéu. Sirlene passou a vida entre a cidade e o quilombo, lugar que se tornou no seu campo de batalha pela luta e resistência das mulheres negras. Ela nasceu e cresceu no mundo do associativismo, e é através dele que sustenta suas batalhas: “As/os jovens militantes precisam entender a importância de se aquilombar, estando perto de quem já está na caminhada há muito tempo.”. Segundo ela, as novas gerações precisam pensar o que pode ser feito de diferente, e o que cada uma pode acrescentar para que a luta por direitos humanos possa prosseguir com sucesso.
Sim, porque é através das novas gerações que podemos mudar nossa realidade, mas também através dos familiares que cada dia nos incentivam e apoiam nossas lutas. Os entes queridos de Roselene Lima, são um exemplo desse incentivo, permitindo-lhe que ela possa seguir sua militância e seus estudos: “Meu esposo é meu maior companheiro de luta! A maioria das vezes que tem encontros, ele está ao meu lado, e as vezes que não está e que eu passo o dia nas reuniões ou quando volto tarde em casa, ele me apoia no dia a dia da família. Ele é bem parceiro, assim como meus quatros filhos.”, nos contou Roselene, da Associação Mulheres Negra do Acre.
Extremamente cansadas, nós mulheres ainda preocupamo-nos com a manutenção de nossos empregos, com a carga de trabalho e com a renda familiar, além de acompanhar o crescimento dos filhos e o seguimento da militância. Para lidar com tudo isso, é preciso parar um segundo e admitir: não podemos dar conta de tudo! Essa tarefa nem sempre é fácil, mas Erika Correia, diretora executiva do Mais Social de Pernambuco, ao longo dos anos conseguiu encontrar uma estratégia: “Ao longo de vários erros, descobri que o equilíbrio é o que faz com que, no final do dia, tudo tenha valido a pena. Então, é buscando esse equilíbrio que hoje eu consigo dormir tranquilamente. Não consigo desassociar minha vida com minha militância, mas é preciso priorizar, então planejo tudo. Até as coisas da minha vida pessoal entram nesse planejamento, como prioridade.”, afirmou Erika.
Ao longo da nossa campanha Mulheres que Inspiram, conhecemos mulheres fortes e valentes, mas que, como todos os seres humanos, já passaram por momentos desanimadores.
“Na vida de militante sempre há momentos de decepção e tristeza, sobretudo quando percebemos que a luta por direitos está retrocedendo, como está acontecendo durante este governo (refere-se ao ex-governo Bolsonaro)”, destacou Atiliana Brunetto, da Coordenação Nacional do Movimento Sem Terra (MST). Segundo ela, a força que empurra as mulheres a continuar suas lutas é a vontade de um mundo de respeito e de solidariedade de uma com as outras, pois “A vida é feita de momentos, portanto gostaria que, mesmo nas adversidades, nossas existências sempre fossem marcadas de felicidade e esperança”, conclui Atiliana.
E para conseguir um mundo mais solidário, igualitário e democrático necessitamos de um relacionamento entre Sociedade Civil e Poder Público o mais transparente possível. É com esse objetivo que Aldiza Soares, junto com outras companheiras, desde 2010 vem reivindicando um ambiente favorável para a atuação das OSC. “Os desafios vivenciados nesse processo de 2010 a 2022 foram imensos, foi uma luta que nos implicou muita persistência para que a Plataforma MROSC não fosse para outro viés que não era o que foi proposto. Hoje percebemos a Plataforma mais robusta, mais articulada e organizada e me orgulho de ter participado dessa caminhada “, afirmou Aldiza, que atua na Pastoral da Criança e Fundação Grupo Esquel.
A campanha “Mulheres que inspiram”, é uma prova de que as mulheres têm força suficiente para lutar por uma sociedade democrática vencendo os obstáculos diários e, com sua fé, autoconfiança e valores, alcançarem seus objetivos de vida. Mulheres, acreditem em vocês!