No Brasil, não há grandes problemas para a criação de uma entidade não governamental, com base no artigo 5º inciso XVII da CF, todavia é necessário que alguns critérios sejam seguidos para que a Organização esteja ajustada à lei, e isso acaba sendo um enorme obstáculo a ser enfrentado.
Existe a titulação como entidade de utilidade pública, que pode ser municipal, estadual e federal. Além disso, com o surgimento da Lei 9.790/99, outra qualificação ficou à disposição das Organizações, a de OSCIP (Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público).
Estas certificações acabam burocratizando, de maneira excessiva, o acesso a direitos e benefícios das Organizações da Sociedade Civil. Por esta razão, a Lei nº 13.019/14, aprova a revogação da Lei nº 91 de 1935, que trata dos títulos de Utilidade Pública Federal (UPF), a fim de estender às organizações os benefícios previstos em lei, independentemente da exigência de ter que cumprir requisitos formais para certificação e titulação de UPF. Sendo assim, a revogação desburocratiza o processo e contribui para uma nova dinâmica de interações entre Estado e a sociedade civil.
A revogação da lei da UPF foi originalmente proposta pelo Grupo de Trabalho de Entidades Sociais do Ministério da Justiça, instituído em 2011, debatida pelo governo no âmbito do Programa Bem Mais Simples e discutida ainda junto com representantes da sociedade civil da Plataforma do MROSC.
Tendo em vista o processo de extinção que aconteceu com as UPF e os benefícios que esta ação trouxe para as entidades não governamentais, há também a necessidade de seguir o mesmo caminho com as UPE. Por isso, já está em tramitação, na Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania, o Projeto de Lei 21.825/2016 para revogar a lei 6.670/1994, que regula os critérios para reconhecimento de utilidade pública das sociedades civis de direito privado e quaisquer instituições filantrópicas sem fins lucrativos no estado da Bahia.
A Plataforma MROSC Nacional e a Plataforma MROSC Bahia apoiam o PL 21.825/2016 e veem como urgente a atenção dos Parlamentares e de toda a sociedade civil sobre a questão. O objetivo da revogação, assim como aconteceu com a Lei 91/1935, é simplificar a relação entre Estado e Organizações da Sociedade Civil.
Para fazer um balanço sobre a questão conversamos com a presidente do Confoco-BA, membro do Comitê Facilitador da Plataforma MROSC, em representação da CESE nesses espaços, Eliana Rolemberg.
Na entrevista, ela faz uma análise sobre as desvantagens da Certificação.
Plataforma MROSC: Por que não há motivos para existência de uma legislação estadual como a 6.670/1994?
Inicialmente, como você já apontou, a Utilidade Pública foi revogada pela Lei 13.019/14 e alterada pela 13.2014/15, em âmbito federal, aliviando a burocracia adicional para as OSC e para o estado, ao qual competia a fiscalização de milhares de entidades. Esperava-se que os estados e municípios seguissem a mesma orientação.
No processo de discussão da proposta de um novo marco regulatório, o Grupo de Trabalho paritário coordenado pela Secretaria Geral da Presidência da República do governo Dilma, considerou a importância da transparência como uma das questões centrais da democratização das relações de parceria entre estado e organizações da sociedade civil. Dessa forma, estabeleceu vários mecanismos reguladores dessa relação, a exemplo do chamamento público obrigatório e da exigência de comprovação de existência da organização que concorre ao edital, de existência há pelo menos 3 anos, com cadastro ativo na Receita Federal. Para os estados, 2 anos e para municípios 1 ano.
Outro elemento a considerar é que a Lei de Certificação de 2009, modificada em 2013, não pressupõe mais a UP para concessão do CEBAS.
Na Bahia, o Grupo de Trabalho paritário encarregado de elaborar a minuta do Decreto de Regulamentação Estadual da Lei 13.019, seguiu a Lei federal, de caráter nacional, a ser aplicada em todos os âmbitos, até o municipal. Porém, sendo um Decreto (Decreto Estadual nº 17.091/2), não poderia revogar a Lei nº 6.670 de 21 de Julho de 1994, bem como outras leis que não se coadunam com a 13.019 e dificultam sua implementação.
Do ponto de vista da política pública implementada pelo MROSC, a UP deve deixar de existir como exigência no estado da Bahia
Plataforma MROSC: Quais desvantagens um título de utilidade pública representa?
A UP trata de um título honorífico, com critérios subjetivos, difíceis de serem aferidos. E não demonstra idoneidade, competência e sim, prestígio.
Para obtenção desse título é necessário que a OSC peça apoio de algum parlamentar e esperar o reconhecimento e a aprovação pela Assembleia Legislativa, que nem sempre conhece a organização, suas atividades, tempo de existência. Esse procedimento pode ser uma porta aberta ao favorecimento de uma prática clientelista.
Tanto a Plataforma MROSC quanto o Conselho de Fomento e Colaboração Confoco/BA, estão empenhados na democratização das relações entre estado e sociedade, com a valorização e fortalecimento da sociedade civil organizada, reconhecimento de sua autonomia, livre expressão e liberdade de associação.
Esperamos que o Projeto de Lei (21.825/2016), de autoria do deputado Rosemberg Pinto seja aprovado o quanto antes.
Por Isis Dias