Na foto, a memória do lançamento da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Organizações da Sociedade Civil, em setembro de 2019. A Frente foi criada para manter um espaço de diálogo entre o Congresso Nacional e as OSC
por Mônica Santana
A Plataforma MROSC iniciou um trabalho de advocacy e consultoria jurídica no segundo semestre de 2020, a fim de influenciar positivamente junto às instâncias de poder do Legislativo e Executivo federais para garantir a segurança jurídica e amparo para as organizações da sociedade civil durante o contexto da pandemia. A articulação está contando uma equipe de profissionais que vem desenvolvendo estratégias para incidência política e a construção de perspectivas de maior amparo legal para as organizações não-governamentais brasileiras.
Duas estratégias estão sendo conduzidas junto ao Congresso Nacional e ao Senado: a incidência para votação em regime de urgência do Projeto de Lei 4113/2020, criado pela Frente Parlamentar em Defesa da Sociedade Civil, apresentado pelo Deputado Afonso Florence e pela PEC 45/220 e PEC 110/2019, que tramita no Senado e trata da reforma tributária.
O PL 4113 prevê a criação de um regime jurídico transitório para as parcerias com o Estado com a sociedade civil organizada, atendendo a aproximadamente 800 mil organizações brasileiras, segundo dados do IPEA. Além de contribuir na criação e execução de tecnologias sociais, na participação política e executando benefícios nas mais diferentes searas, por vezes, atuando onde as ações do Estado não chegam, as OSC empregam diretamente mais de 2 milhões de pessoas e desenvolvem mais de 45 mil projetos pela melhoria do país. A partir desse contexto, as entidades se viram em condição instável em 2020 com a inviabilidade de executar diversos projetos por conta do contexto da pandemia e em situação de instabilidade jurídica junto aos governos. O projeto propõe a criação de um regime jurídico transitório durante a pandemia, aplicável às parcerias entre Estado e sociedade civil, de modo a orientar os gestores públicos e as organizações sobre ajustes necessários neste novo cenário de restrições e a gerar mais segurança jurídica para as relações de parceria.
A Plataforma MROSC elaborou uma nota técnica que trouxe contribuições para o Projeto de Lei Estadual 4113/2020, manifestando apoio ao trabalho da Frente Parlamentar Mista em Defesa das Organizações da Sociedade Civil, mas também apontando a necessidade de uma tramitação mais célere, dado a delicadeza do momento no qual as organizações da sociedade civil se encontram a partir da pandemia do Covid-19 e situação de insegurança jurídica por conta da inviabilidade de cumprir uma série de ações previstas em contratos de parcerias.
O projeto de lei apresenta normas de caráter transitório aplicáveis a parcerias celebradas pela administração pública e organizações da sociedade civil (OSC), durante o período de calamidade pública da Covid-19 de que trata o Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020. Além disso, trata sobre a suspensão dos contratos, repasse de recursos, prestação de contas, descumprimento de metas, celebração de parcerias emergenciais e devolução e parcelamento de recursos. O PL 4.113/2020 pode garantir a possibilidade de repactuação de metas e resultados e prorrogação do calendário de execução e de prestação de contas durante o tempo que durar a pandemia, em razão da dificuldade e, por vezes, inviabilidade de reunir documentos com os escritórios fechados e o teletrabalho imposto pelo isolamento. Trata-se de previsão positiva e extremamente necessária.
Advocacy
De acordo com a consultora em advocacy, Melissa Terni Mestriner, a estratégia adotada é apresentar um requerimento para que o projeto de lei seja levado à plenária no Congresso para votação em regime de urgência, dada a necessidade de estabelecer parâmetros que se apliquem ao contexto da pandemia. Nesse percurso, há a necessidade de realizar uma audiência pública na Comissão Parlamentar Mista do Covid-19, na qual seria possível ouvir os representantes da sociedade civil e membros da Plataforma MROSC para explicar para os deputados porque é necessário um regime jurídico transitório para o setor.
“As parcerias da sociedade civil sofreram um significativo impacto durante a pandemia, sendo obrigadas a rever planos de trabalho, as entregas dos produtos e muitas vezes, implicando em suspensão de contratos. Se o Estado não repassa os recursos para as entidades, não há como remunerar as equipes e milhares de pessoas ficam em situação vulnerável” explica Mestriner. Segundo ela, o regime jurídico transitório trará regras que permitirão o ajuste dos planos de trabalho, os prazos de entrega dos produtos e a liberação de recursos. “É necessário ter uma nova disposição legal tanto para as OSCs quanto para os gestores públicos” acrescenta a consultora.
As ações de advocacy também buscam defender as organizações da sociedade civil na reforma tributária, que conta com propostas de emenda constitucionais sob análise na Câmara dos Deputados e no Senado. “Estamos acompanhando as audiências e estamos em diálogo para elaborar uma proposta de texto de emenda para reforma tributária e construção de um regime tributário adequado ao contexto das organizações. Por exemplo, não faz sentido as entidades pagarem igual a empresas que tem foco no lucro e cujo propósito é totalmente diferente”. O empenho do advocacy empreendido pela Plataforma MROSC é para incluir ainda em 2020 a discussão na pauta da Comissão Mista do Covid.
Urgência
As organizações da sociedade civil organizada têm urgência em garantir a segurança jurídica nesse momento delicado de pandemia, cujo fim não parece próximo no mundo. Pela falta de um regramento abrangente, fica a cargo dos Governos Estaduais a decisão sobre a suspensão ou manutenção dos repasses para as parcerias com as OSC. De acordo com Laís Figueirêdo, consultora jurídica da Plataforma MROSC, “interpretação do ordenamento jurídico deve levar em consideração, além da própria lei de abrangência nacional, as normas e as orientações locais emanadas pela Administração Pública”.
Em artigo escrito ao lado das sócias Paula Raccanello Storto e Juliana Brandão de Andrade, a especialista adverte que a avaliação da administração pública precisa levar em consideração as consequências e o espírito do regime jurídico próprio da sociedade civil organizada, observando que a suspensão dos repasses de recursos públicos para organizações da sociedade civil com parcerias em execução, induzindo ao fechamento de projetos e atividades, à demissão de sua equipe de trabalho e à descontinuidade da oferta dos serviços.
Nesse sentido, o Marco Regulatório da Sociedade Civil, caracterizado pela Lei 13.019/14, oferece interpretação do ordenamento jurídico deve levar em consideração, além da própria lei de abrangência nacional, as normas e as orientações locais emanadas pela Administração Pública. “O custo da crise causada pela pandemia não pode ser repassado integralmente para as organizações da sociedade civil que se dispuseram a executar atividades e projetos em parceria com a administração pública, penalizando as políticas públicas participativas e os profissionais contratados pelas OSC. É possível, pois, repactuar metas, indicadores e resultados esperados nos planos de trabalhos, e promover uma adaptação de metodologias, ações e orçamentos, sem romper completamente com a lógica de parceria e sem desmerecer a relevância pública do trabalho desenvolvido pelas organizações nas parcerias, previstos como uma conquista alcançada pelo MROSC” acrescenta a jurista.